ARTIGO – A FURG E O COSTA CONCÓRDIA

    O transatlântico Costa Concordia tombado na costa da ilha italiana de Giglio, no 10º dia após o acidente, em 2012 — Foto: Tony Gentile/Reuters

    A FURG E O COSTA CONCÓRDIA

    Paulo Gastal Neto*

    Nesses tempos difíceis de compreender a racionalidade das ações de algumas pessoas, li que a FURG – Fundação Universidade do Rio Grande, por decisão de seu Conselho, resolveu cassar títulos outrora outorgados à personagens da história, que foram decisivos na constituição da instituição. A decisão, pelo que se percebe através das inúmeras manifestações da comunidade rio-grandina, satisfaz apenas os desejos reacionários de uma minoria, que desconhece a história e se diz representar a entidade de ensino para decisões em favor dela. No caso específico jogou contra.

    Me detenho, neste artigo, em apenas um dos personagens atingidos, em função da vocação da referida universidade: o mar. Mais pela sua interferência em favor da instalação do 5º Distrito Naval em Rio Grande. Ela sim – a universidade -, viria a se beneficiar, posteriormente, através de uma gama de ações do cassado, como o Programa Brasileiro na Antártica. Me refiro ao Almirante Maximiano da Fonseca.

    O ato do Conselho da Universidade que cassou o título de Doutor Honoris Causa referendado ao almirante, lembrou-me a atitude do comandante do navio Costa Concórdia, Francesco Schettino, (talvez pela relação com o mar) que ao ver a sua nau tombada, teve uma atitude irresponsável: abandonou o navio, desconsiderando uma máxima do mundo marítimo, que diz que o comandante é o ‘último a deixar o navio quando este está afundando’. A FURG protagoniza, metaforicamente, algo parecido: de certa forma iniciando um processo de abandono para com sua vocação e virando as costas para o setor que lhe proporciona a notoriedade nacional.

    O Capitão Francesco Schettino sendo julgado na Itália. Foto: Internet

    O Cruzeiro Concordia, naquela ocasião, navegava na costa da Toscana, fez uma manobra malsucedida sob o comando de Schettino e quase foi a pique. Durante o julgamento do agora ex-capitão, alguns tripulantes disseram que ele teria feito a manobra para chamar a atenção de uma dançarina ‘moldava’ com quem estava tendo um caso extraconjugal. A FURG, na mesma linha, tenta chamar a atenção, só que o modelo de afundamento é outro: ela dissemina o rancor, tem o ranço como prioridade, a ideologização como bandeira, o atraso como ideário e o desconhecimento como referência, ou seja, é a antítese do pensamento que deve reinar numa instituição de ensino superior.

    Em março de 2009 tive a oportunidade de entrevistar o almirante Edy Sampaio Espellet. Um homem de marinha que me recebeu em seu apartamento, em Copacabana, no Rio de Janeiro, para uma longa conversa informal e histórica. Está gravada. Foi uma das poucas vezes que ele falou ao público, de maneira intimista. Eddi Sampaio Espellet nasceu em Pelotas, conhecia amiúde a região, sobretudo a costa gaúcha e o trecho rio-grandino. Ele ingressou na Escola Naval como aspirante em 1936. Faleceu no dia 23 de junho de 2010, um ano após a entrevista a mim concedida e nela relatou dezenas de estórias, entre elas uma que reproduzo abaixo e que sintetiza a decisão rasteira, desonrosa e estúpida tomada pela universidade de Rio Grande:

    Eu e o Almirante Edy Sampaio Spellet em seu apartamento em Copacabana, em 2009. Foto: Arquivo pessoal

    Paulo Gastal Neto – Como foi à definição pela instalação do 5º. Distrito Naval em Rio Grande?

    Almirante Espellet – O 5º. Distrito Naval estava sediado em Florianópolis, mas a cidade por problemas de natureza como a assoreamento do porto e com a desatualização da atividade portuária por lá perdendo o valor, eu, como comandante de operações navais, determinei um estudo ao comandante do distrito que era meu subordinado, que encontrasse uma alternativa à capital catarinense. Então determinei ao então almirante Caminha que fizesse um estudo junto ao estado maior sobre qual seria essa alternativa para sediar o 5º. Distrito Naval. O estudo, muito bem feito, determinou três alternativas: Rio Grande, Porto Alegre ou São Francisco. Em minha opinião, mesmo São Francisco sendo um porto razoável, não tinha a importância do porto de Rio Grande. Porto Alegre já tinha um general quatro estrelas e iria gerar alguma incompatibilidade. Então Rio Grande foi a opção. Naquela época o porto de Rio Grande havia se transformado no super porto. Mas o ministro da época – Almirante-de-Esquadra Geraldo Azevedo Henning – não concordou com essa solução.

    Então suspendi o envio do expediente a ele para não ouvir uma negativa. Eu sabia que seria nomeado chefe do estado maior da armada pela minha antiguidade. E então quando me tornei chefe do estado maior da armada fiz passar pelas comissões o expediente determinando Rio Grande como sede do 5º. Distrito Naval e guardei o documento comigo. Quando eu fui para a reserva, no meu último despacho com o ministro, obedecendo uma tradição de marinha, eu tinha direito a um testamento. O ministro me perguntou: – E o seu testamento? Eu disse: – Meu testamento está aqui. Você não leu. Henning encerrou dizendo: – Então guarde isso e espere o novo ministro que eu não sei quem é, nem você sabe, e o novo ministro vai ler e vai dizer se vai concordar ou não.

    E o ministro Henning concordou comigo e disse que cumpriria o meu pedido. Passaram-se uns 15 dias, o novo ministro assumiu. Era o almirante Maximiano Eduardo da Silva Fonseca, meu amigo e que conhecia bem Rio Grande, que em seguida que chegou ao cargo leu o despacho do comando e me telefonou para dizer que concordava e iria fazer a instalação do 5º. Distrito Naval em Rio Grande. Eu respondi: – Então ministro você vai me convidar para a inauguração do Distrito em Rio Grande e assim foi. Lá está o 5º. Distrito Naval em Rio Grande.

    Este trecho que reproduz minha pergunta e a resposta do Almirante Spellet foi apenas uma pequena parte do depoimento de um homem vocacionado para as coisas do mar (assim como deveria ser a universidade), que nasceu aqui e conhecia a região sul. Eu sou testemunha de um relato histórico e decisivo, de uma ação de um gaúcho, de Pelotas, amigo do Almirante Maximiano que por sua exclusiva atitude, garantiu que parte do ideário da universidade rio-grandina tivesse ao seu lado o 5º Distrito Naval.

    Maximiano merece os mais elevados conceitos dos rio-grandinos e os têm, como se perceberá nas manifestações que reproduzo abaixo deste artigo. A FURG e tão somente ela é que mancha a sua história, desestrutura o alicerce de uma construção que merecia prosseguir em frente de maneira elevada. Ela dá o entender que abdica de ser uma instituição voltada para o mar e com vocação a vida marinha, para iniciar o ‘afundamento do seu próprio navio’ como fez Schettino. Coloca em destaque sentimentos revanchistas acima dos interesses maiores da instituição. Fortalece a pobreza de espírito em detrimento do altruísmo. Deixa de ser uma instituição plural e converte-se num centro reacionário e atrasado. Uma pena que por lá, estejamos testemunhando o enveredar na direção oposta do que propõe o conceito fim de uma universidade. A receita covarde do comandante do Costa Concórdia fez alguns poucos adeptos no sul do Brasil. O julgamento será da história.

    *Radialista e editor do www.pelotas13horas.com.br

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    COMUNIDADE DE RIO GRANDE REAGE CONTRA DECISÃO DO CONSELHO DA FURG

    A CÂMARA DE COMÉRCIO DA CIDADE DO RIO GRANDE E A ALIANÇA RIO GRANDE EMITIRAM NOTA OFICIAL SOBRE A DECISÃO DA FURG. CONFIRA ABAIXO:

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    O CENTRO DE NAVEGAÇÃO RIO-GRANDENSE – CENTRONAVE EMITIU NOTA:

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    OS FILHOS DO ALMIRANTE MAXIMIANO DA FONSECA ENVIARAM CARTA AO REITOR DA FURG. CONFIRA O TEOR DA MISSIVA:

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    CARTA ENVIADA AO REITOR DA FURG PELO CENTRO DE EXCELÊNCIA PARA O MAR BRASILEIRO:

    Ao  Professor Doutor Danilo Giroldo.
    Reitor da Universidade Federal do Rio Grande (FURG)
    Com tristeza, o Centro de Excelência para o Mar Brasileiro (Cembra) tomou conhecimento de que a FURG cassou o título de Doutor Honoris Causa, concedido ao Almirante de Esquadra Maximiano Eduardo da Silva Fonseca, Ministro da Marinha no período de 1979 a 1984.
    O Cembra considera que essa atitude foi totalmente injusta, uma vez que o AE Maximiano  pautou a sua vida pública por uma extrema correção,  sempre seguindo as regras constitucionais e humanitárias, devidamente amparadas em preceitos legais.
    Além disso, cabe enfatizar que  o AE Maximiano prestou relevantes serviços à Ciência Brasileira, tendo sido protagonista do Programa Antártico Brasileiro (PROANTAR), do qual participam muitos profissionais vinculados à FURG, e do Programa Nuclear da Marinha (PNM), dentre outros.
    Quanto ao NHi Canopus, todas as pessoas que para lá foram levadas, receberam tratamento digno. A bem da verdade, reproduzo, a seguir, um texto  publicado no Jornal AGORA, em 23/03/1993: “O Canopus era comandado na época pelo Comandante Maximiano da Fonseca, que teve uma atuação muito elogiada pela maioria que sofreu prisão em seu bojo. Não apenas na época posterior  à libertação dos presos, mas mesmo depois da chamada abertura, alguns ex-prisioneiros no navio hidrográfico nos disseram, graciosamente, sem pressões, que tinham sido muito bem tratados a bordo.”
    Acresce, o fato que a Comissão Nacional da Verdade nada apurou a respeito do AE Maximiano e do NHi Canopus.
    À vista do exposto, o Cembra  julga que, por uma questão de justiça, a decisão do Conselho Universitário (Consun), a respeito do Almirante de Esquadra Maximiano Eduardo da Silva Fonseca, deva  ser revista e reavaliada.
    Atenciosamente.
         Julio Soares de Moura Neto.
         Almirante de Esquadra.
         Coordenador Executivo do Cembra.
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    MEMORANDO ENVIADO PELO DIRETOR DO INSTITUTO DE OCEANOGRAFIA DA FURG AO REITOR DA UNIVERSIDADE:
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    NOTA DA CDL – CÂMARA DE DIRIGENTES LOJISTAS DE RIO GRANDE E SÃO JOSÉ DO NORTE
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    Maximiano Eduardo da Silva Fonseca*

    Nasceu no Rio de Janeiro em 6 de novembro de 1919 e morreu também no Rio de Janeiro em 3 de abril de 1998. Atingiu o posto de Almirante-de-Esquadra e é o patrono do Corpo Auxiliar Feminino da Reserva da Marinha, criado por ele.

    Biografia

    Aspirante da turma de 1937 na Escola Naval, ainda nas instalações da ilha das Enxadas, formou-se como guarda-marinha em 1941, já nas instalações da ilha de Villegagnon. Foi promovido a segundo-tenente em 16 de outubro de 1942, a primeiro-tenente em 30 de junho de 1944 e a capitão-tenente em 9 de maio de 1946. Fez o curso de Hidrografia e Navegação para Oficiais em 1949. Por merecimento obteve as promoções a capitão-de-corveta (15 de março de 1953), capitão-de-fragata (11 de julho de 1958) e a capitão-de-mar-e-guerra (18 de agosto de 1965). Posteriormente ascendeu a contra-almirante (31 de dezembro de 1969), vice-almirante (31 de março de 1974) e a almirante-de-esquadra (25 de novembro de 1976).

    Na Escola de Guerra Naval fez os cursos de:

    • 1956 – Preliminar de Comando
    • 1959 – Comando
    • 1962 – Superior de Comando.

    Entre as suas realizações destacam-se:

    • a implementação do Programa Nuclear da Marinha;
    • a implementação do Programa Antático Brasileiro;
    • a criação do Corpo Auxiliar Deminino da Marinha;
    • a transferência do 5º Distrito Naval para a cidade de Rio Grande;
    • a dinamização da Sociedade de Amigos da Marinha (SOAMAR);
    • a construção de diversas embarcações da Armada em estaleiros nacionais; e
    • a criação do Quadro de Artífices para Praças.

    A 22 de Setembro de 1981 foi agraciado com a Grã-Cruz da Ordem Militar de Avis e a 18 de Maio de 1983 foi agraciado com a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique de Portugal. Após ser transferido para a Reserva da Marinha, exerceu o cargo de diretor da Petrobras, de 30 de abril de 1985 a 10 de junho de 1991. Em sua homenagem, em junho de 1998, o terminal da Ilha Grande da Petrobras teve o seu nome alterado para Terminal Marítimo Almirante Maximiano da Fonseca. Foi Ministro da Marinha no governo do presidente João Figueiredo, de 15 de março de 1979 a 21 de março de 1984.

    *Fonte: Wikipedia

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    NAVIO POLAR ALMIRANTE MAXIMIANO

    O Almirante Maximiano da Fonseca também é homenageado emprestando o seu nome a um dos principais navios do projeto Brasil na Antártica.

    Navio Polar Almirante Maximiano. Foto: Marinha do Brasil / Divulgação

    O Navio Polar Almirante Maximiano – H 41, ex-Ocean Empress, ex-Naeraberg, ex-American Empress, ex-Maureen Sea, ex-Scotoil I, ex-Theriot Offshore I, é o primeiro navio a ostentar esse nome na Marinha do Brasil, em homenagem ao Almirante Maximiano Eduardo da Silva Fonseca, hidrógrafo de destaque e Ministro da Marinha de março de 1979 a março de 1984, no Governo do Presidente João Baptista de Oliveira Figueiredo. Foi construído pelo estaleiro Todd Pacific Shipyards Corp., em Seattle, Washington, onde o então casco n.º 58 teve a sua quilha batida em 20 de agosto de 1973, foi lançado ao mar em 13 de fevereiro de 1974 e foi entregue em junho de 1974, mas só iniciou suas operações comerciais em 19 de dezembro de 1978.

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    IRONIAS

    O Navio Polar Almirante Maximiano foi adquirido e assim batizado por decisão do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2009, após visita ao Continente Gelado e incorporado à Marinha do Brasil no mesmo ano. Ele foi comprado pelo governo brasileiro na cidade de Bremerhaven, Alemanha. Após as adaptações necessárias às realizações de pesquisas na região da Antártica, como construções de laboratórios, espaços habitacionais, hangar e convés de vôo para operar aeronave, o Navio suspendeu de Bremerhaven em fevereiro de 2009, demandando os portos de Brest, Lisboa, Las Palmas e Recife, chegando então ao Rio de Janeiro.

    Ironicamente o navio Almirante Maximiano atraca seguidamente no Porto de Rio Grande para dar suporte as Operações Antártica, inclusive com a participação de pesquisadores, professores e alunos da Fundação Universidade do Rio Grande – FURG. Ele serve, em Rio Grande, como Apoio Antártico para a Universidade Federal do Rio Grande (ESANTAR/FURG), aonde carregaram roupas para mais de 140 pessoas, entre tripulantes e pesquisadores, assim como praticamente todo o material necessário para o trabalho a ser realizado no Continente Antártico: água, alimentos, barracas, equipamentos de alpinismo e sobrevivência, medicamentos, gás e até veículos como motos de neve e quadriciclos.

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