
Azeite: produção nacional conquista espaço após avanços tecnológicos – Foto: Sergio Coimbra.
De O GLOBO
POR ANDREA D’EGMONT
Os registros da existência de oliveiras remontam ao ano 6.000 a.C., e há provas de sua importância social, econômica e religiosa no Império Romano. Fundamental na dieta mediterrânea, só recentemente, o Brasil começou a obter excelentes resultados no cultivo de azeitonas em áreas de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e São Paulo.
As olivas brasileiras estão localizadas em áreas de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e São Paulo. O entusiasmo com o azeite nacional é tamanho que algumas safras já participaram de painéis de degustação promovidos pelo Comitê Oleico Internacional, tendo obtido boa avaliação.
O óleo de oliva virou um assunto tão especial no Brasil que o Senac-Rio, tradicional instituição de ensino, depois de promover cursos e workshops sobre o tema, incluiu-o este ano como disciplina em todos os seus cursos de gastronomia e nutrição.
— Começamos timidamente a investir em olivicultura usando nosso know-how em desenvolvimento de mudas. Temos surpreendido até os agrônomos mais céticos com relação à adaptação das oliveiras às condições geoclimáticas do Brasil. Aqui no Rio Grande do Sul, a nossa empresa, a Prosperato, produziu este ano 10.000 litros de azeite — relata o produtor Rafael Marchetti.
E, pasmem, já existe até mesmo uma azeitona brasileira, a Maria da Fé, desenvolvida por olivicultores e pesquisadores da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig). Ela foi batizada em homenagem à cidade de mesmo nome, no Sul de Minas, onde fica a fazenda da Epamig e onde foi realizada a primeira extração de azeite no Brasil, em 2008.
Vera Marsagão, que desenvolveu o azeite OLIQ em São Bento de Sapucaí, na divisa de São Paulo com Minas Gerais, refere-se com entusiasmo à sua produção de azeite e também à Associação de Olivicultores dos Contrafortes da Mantiqueira (Assoolive), que reúne cerca de 40 olivicultores de Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro.
— Eles são o que chamo de neorrurais. Gente que sempre viveu na cidade e escolheu mudar para o campo, mas busca inovações agrícolas — explica.
NOVAS TECNOLOGIAS
Marcelo Scofano, chef e especialista em azeites, acaba de voltar de uma imersão de três meses na Espanha, o maior produtor mundial do óleo de oliva, onde se dedicou à pesquisa.
— A cultura do azeite, em função das novas tecnologias de cultivo e extração, passa por uma enorme transformação e expansão. O cultivo de oliveiras está ganhando novas terras. Os óleos de oliva que chegavam ao Brasil, de um modo geral, estavam passados, oxidados e sem as suas propriedades características. Infelizmente, a memória gustativa e afetiva associava esse azeite defeituoso ao gosto do bacalhau do Natal e da Páscoa. Isso, no entanto, está mudando. O azeite tem despertado interesse, e novos padrões de avaliação têm surgido — avalia Marcelo, que foi o primeiro brasileiro a integrar o corpo de jurados da Seleção de Jaén, concurso anual que escolhe os melhores azeites dessa província espanhola, que também é a maior produtora do mundo, e do concurso Ovibeja, importante competição em Beja, na região portuguesa do Alentejo.
Em relação aos importados, o azeite brasileiro tem uma vantagem. O intervalo entre a produção no campo e a mesa do consumidor é menor. Com a colheita brasileira terminada entre março e abril, nossos rótulos já estão à venda. No caso do óleo importado, o que se encontra hoje no supermercado foi produzido no ano passado. Em se tratando de azeite, quanto mais novo, melhor.
São azeites brasileiros: Oliq (São Bento do Sapucaí-SP), Olivais da Bocaina (Silveiras-SP), Ouro de Sant’Ana (Livramento-RS), Prosperato (Caçapava do Sul-RS) e Olivas do Sul (Cachoeira do Sul-RS).
Tive a oportunidade de viajar por algumas das principais áreas de produção de azeite no mundo e acompanhar a colheita das azeitonas. Em todos os lugares — Chile, Argentina e Espanha — vi um grupo ansioso e com uma agitação perturbadora iniciando uma corrida contra o tempo, para fazer com que as azeitonas chegassem rapidamente ao entreposto. Lá elas foram lavadas, analisadas, selecionadas, batidas, e sua massa centrifugada, para extrair sua puríssima seiva: o azeite. Todo esse processo acontece num ritmo frenético e deve ser concluído em poucas horas, para impedir a oxidação do óleo e fazer com que ele continue perfeito para o consumo, atingindo o ápice sensorial no prato com os ingredientes que o acompanham.
As oliveiras precisam de cuidados especiais para a aclimatação e a adaptação, além de água e poda na medida certa. Seus frutos são como as pessoas: podem se parecer, mas cada tipo é único, reservando sabores, aromas, acidez, densidade, texturas e notas sensoriais surpreendentes. As árvores mais jovens costumam dar azeitonas de sabor mais sedicioso, e, à medida que vão ficando mais maduras, com cerca de 120 anos, seus frutos ganham complexidade. É como escreve Charles Quest-Ritson, em seu livro “Azeite”: “a oliveira, se negligenciada, enfraquece, mas nunca morre; e começará a produzir novamente se voltar a ser adequadamente tratada”.
Brígida Herrera, diretora do Instituto de Investigación y Formación Agraria y Pesquera (Ifapa) da Espanha e uma das maiores autoridades do mundo em azeite, explica que só em seu país natal são mais de 260 variedades de azeitonas: Picual, Hojiblanca, Mazanilla, Verdial, Arbequina, Picuda,Cornicabra, Koroneike etc. Cada uma delas tem notas sensoriais muito distintas. Brígida ajuda a derrubar alguns mitos sobre o sumo da azeitona: