Pelo pioneirismo, Rio Grande foi escolhida para sediar o 2º Congresso Latino-Americano de Recuperação da Fauna Marinha, que se inicia hoje, no sul do Estado.
Apesar de relativamente nova, a proteção marinha apresentou crescimento nos últimos anos, segundo o oceanólogo Lauro Barcellos, diretor do Museu Oceanográfico da Furg e organizador do congresso. A partir da Lei 6.938, de 1981, por influência do pesquisador Paulo Nogueira Neto, a preservação ambiental tornou-se uma atividade reconhecida. E foi com ela que aumentou a importância de postos como o Cram.
Criado em 1974, com influência dos cientistas Eliézer de Carvalho Rios (que dá nome ao Museu Oceanográfico), Judith Cortesão e Rudinei Nascimento, além de Barcellos, o Centro de Recuperação da Furg é uma das referências brasileiras. Nessas quase quatro décadas de trabalho, pelo menos 8 mil animais receberam algum atendimento. Nos últimos três anos, 150 alunos dos mais variados cursos universitários fizeram parte do programa de capacitação criado no local e cerca de 30 voluntários participam semanalmente de alguma atividade.
Encontro ditará os protocolos
Orientados pelo professor Rodolfo Silva, diretor do Cram, os interessados aprendem a trabalhar desde o resgate de algum animal ferido em qualquer parte do litoral até o tratamento médico e a devolução ao ambiente marinho. Mas, mais do que um hospital de animais, o centro é um ponto importante de pesquisa, um produtor de conhecimento sobre proteção, justamente por misturar de engenheiros de computação a veterinários.
– Desde que cheguei, em 1996, entendi que era necessário fazer esse mix de culturas, recebendo alunos de cursos e instituições diferentes.
Neneco, como é conhecido, lembra que é graças à ajuda de empresas que consegue manter o centro funcionando. São elas que provêm os mais de 30 quilos de peixe diários necessários para alimentar os animais em tratamento. A Petrobras também consolidou-se como a grande parceira do Cram, financiando o trabalho e garantindo a existência do local.
Com esse currículo de décadas de funcionamento e excelência, os pesquisadores da Furg receberão cientistas importantes de outras partes do mundo. Entre as presenças já confirmadas no Congresso, estão Frances Gulland, cientista do Centro Mamífero Marinho, e Jay Holcomb, diretor emérito do Centro Internacional de Salvamento de Aves, ambos dos Estados Unidos.
A troca de experiências entre os grupos poderá ditar os protocolos mundiais de tratamento a emergências, cuidados com animais e habitats. Enquanto os americanos têm políticas mais efetivas de fiscalização ambiental, o Rio Grande do Sul lidera na produção do conhecimento. A união desses pontos poderia contribuir para melhorar a condição oceânica e da fauna.
Barcellos lembra que, na década de 1970, uma baleia adentrou a barra de Rio Grande. Ela virou atração, mas pelo lado negativo. Diversas pessoas foram ao local e atiraram no animal, que se transformou em uma espécie de alvo.
– Hoje isso seria considerado um crime. E queremos popularizar ainda mais o tema da preservação. Temos uma consciência ecológica maior do que gerações anteriores e devemos transportar isso para as próximas – resume.
* 8 mil animais receberam atendimento no Cram em 40 anos
* 150 alunos de cursos como Oceanologia, Biologia e Veterinária passaram pelo programa nos últimos três anos
* Por semana, 30 voluntários, entre portugueses, americanos e argentinos, participam das atividades do hospital de animais do mar
Zero Hora – Como é visto o trabalho do Cram mundialmente?Barbara Callahan – O Cram é uma referência. Ele teve grande importância para o crescimento brasileiro na preservação ambiental. O trabalho é tão forte que agora recepciona um congresso desta magnitude. É um orgulho mundial.
Zero Hora – Como o Brasil cuida da fauna marinha?
Jay Holcomb – O Brasil está na vanguarda da proteção. Com centros de excelência em tratamentos como o Cram e legislação firme, conseguiu melhorar muito a condição. Deveria ser espelho para países como Noruega e Alemanha, que não possuem qualquer combate a derramamentos de óleo ou tragédias ambientais.
Zero Hora – Como este congresso pode ajudar a mudar essa visão?Jay Holcomb – Todas as nossas experiências, que são muitas, ajudarão a criar novos protocolos de combates a derramamentos e salvamento de animais. Sabemos que só com comoção popular conseguiremos mudar a mentalidade dos governos, mas precisamos saber como reagir em caso de tragédia. É uma questão emocional, que precisará de capacidade técnica. Esse congresso ajudará nisso.