Quarta geração de imigrantes franceses que aportaram em Pelotas, Rio Grande do Sul, nos anos 1930, os irmãos Paulo e Ricardo Crochemore sentiram-se desafiados no ano de 2006, quando consultores do Centro Nacional de Tecnologias Mais Limpas (CNTL) do Senai garantiram a eles que havia em sua produção de doces desperdícios de recursos naturais que resultavam em perdas econômicas significativas.
Herdeiros da pequena indústria que leva o nome da família, e das antigas receitas de doces de frutas feitas sem corantes ou conservantes, exceto o próprio açúcar, eles apostaram no ajuste do processo produtivo. A perda de vapor durante o cozimento das frutas era fonte de desperdício de água. Gastaram R$ 500 na reforma da caldeira e economizaram cerca de 387 metros cúbicos de água por ano. Por retornar ainda quente ao processo produtivo, o reúso da água proporcionou uma economia de 5% no consumo da lenha. Em um ano, o negócio dos dois irmão computou economia de R$ 1,4 mil.
“Tu vê o quanto coloca de dinheiro fora, quando sente a economia no bolso”, resume Paulo, confessando que o retorno inspirou uma adaptação da receita de compota de figo, que elimina a lixiviação da casca, processo que consome muita água. “Desde 2008, cresce a produção do doce sem casca”, diz, com números da safra 2012 encerrada em abril: 28 toneladas do tradicional doce com casca, para 15 sem ela.
Dos mais de 40 itens produzidos para o mercado regional, os derivados de pêssego são o carro-chefe, seguidos pelos doces de figo, laranja e morango. Em todos, água é insumo obrigatório. “Ela vem do poço, mas pagamos pela energia, tratamento e lagoas de decantação”, avalia o empresário, para avisar que outras formas do reúso já estão programadas como o próximo investimento da indústria.
A gestão da água é uma tendência geral mas, enquanto empresas de pequeno e médio porte investem na reutilização e redução da geração de efluentes, as maiores estão alguns passos à frente, adotando tecnologias mais caras, conforme explica o consultor Michel Gerber, da Eccocel, que acompanha os Crochemore desde 2006.
Lançar no solo efluentes tratados da indústria da alimentação, diz, é uma solução mais difícil de que parece. Exige estudos e licenciamento prévio junto ao Fepam, a agência ambiental gaúcha, e monitoramento constante. Resíduos da suinocultura e dos matadouros, explica Gerber, contêm nitrogênio e fósforo, ingredientes de adubos químicos. Mas, em excesso, acabam por salinizar o solo. A implantação, diz ele, pode custar mais de R$ 5 mil. Já o retorno será mais significativo, se forem computados também valores intangíveis, como ter um córrego mais limpo.
“Vi empresas que faturam R$ 50 milhões perdendo R$ 2,5 milhões por ano sem perceber, pelo desperdício de recursos naturais”, atesta a engenheira química Rosele Wittée, coordenadora da área de consultoria do CNTL. Com um rol de 500 empresas atendidas, ela usa um portfólio de boas práticas para difundir a produção mais limpa, que busca produzir mais com menos recursos. Para ela, a generalização da cobrança pelo uso da água, ainda restrita a algumas bacias hidrográficas, estimulará investimentos nessa área. Mas a falta de indicadores do consumo é um entrave, pois dificulta o monitoramento do desempenho.